14.5.09

[Ventos de Nordeste] MSE

6. A chegada, ou 3 aeroportos num dia

13/10: Amsterdam -> Schiphol Airport (comboio)

Easy Star All*Stars – No Surprises


A rolar na paisagem escura e plana, o movimento do comboio embala-me e chama-me para o sono mas tento não adormecer com medo de me roubarem a mochila ou de perder a estação do aeroporto. Vou, à laia de exercício mental, tentando lembrar-me de tudo o que vi durante estes dias para me manter acordar e também fazer passar o tempo.

Chegados então a Schiphol, é altura de subir as escadarias para a estação. Meio adormecido, lembro-me dos jogos do Super Mario em que se descia nos túneis para outros níveis e mundos: ao descer as escadas para o túnel, tinha entrado no mundo da Holanda; agora subia para voltar ao mundo normal. Rio-me desta memória de infância e prossigo para o meu terminal que, como em todos os aeroportos por onde passo nesta aventura, é do outro lado do aeroporto.

Durante a caminhada descubro este globo que tem os fusos horários e que me mostra bem o que havia percorrido e quão longe estive de casa e ainda estou.





Procuro o meu balcão de check-in; ainda não está anunciado pois o meu voo é pelas 7h e são umas 2h da manhã. Dirijo-me para os balcões da SAS e aninho-me como possível nas cadeiras com braços de cada lado, o que me leva a suspeitar que estão feitas de propósito para não deixar as pessoas dormir nos bancos. Insatisfeito com esta falta de consideração pelos viajantes, deixo-me ficar por lá.

Sempre com um olho aberto e com os pensamentos focados em não ceder ao cansaço largamente acumulado e perder o avião, durmo intranquilo mas durmo com os outros viajantes a fazerem-me companhia num aeroporto vazio, adormecido e sossegado. Ao fim de umas horas, começam a circular mais pessoas e o aeroporto parece acordar com os balcões que abrem pelas 5h. Deixo-me estar mais um pouco a descansar e só depois faço o check-in com o voo de ligação entre København [lê-se shó-ben-ha (inspirado) – ven] e Helsinki.

Feito o check-in, vou a uma casa de banho lavar os dentes e a cara para acordar um pouco e ter um mínimo ar apresentável antes de me dirigir à porta de embarque.

Schiphol, Nederland -> Copenhagen Airport, Kastrup, Danmark (avião: voo SK 550 da Scandinavian Airlines)

Embarco no avião e espero até levantarmos para ligar mais uma vez o iPod para um voo de 1:25. Antes de adormecer ainda me consigo aperceber das estufas iluminadas à volta do aeroporto, rectângulos de luz na madrugada escura a brilhar pela janela. À medida que nos afastamos as luzes tornam-se conglomerados luminosos, como se a própria Terra fosse radioactiva são os únicos pensamentos que consigo formular antes de sucumbir ao cansaço.

Dou por mim a acordar já com o avião a descer para København. A neblina amortalha pedaços de terra dispersos pelas águas esverdeadas e calmas. Aterramos com suavidade e ouço Dinamarquês e como ele é uma versão raspada e arranhada do Sueco, língua que desliza na língua; como o Castelhano e o Português. Saio do avião e, sem surpresas, descubro que a porta de embarque para Helsinki é no Pingo Doce lá do sítio, ou seja, no sítio do costume: do outro lado do terminal. Ao menos o aeroporto é agradável, mesmo a esta hora madrugadora: aparentemente, é considerado um dos melhores aeroportos do mundo, tendo ganho a distinção de melhor aeroporto europeu e mundial algumas vezes.

Sempre a andar, sempre à procura, sempre a dormir em pé. Dou por fim com a porta e assento arraiais num espaço comum a três portas de embarque numa varanda com vista para as pistas ainda submersas na neblina matinal. Tempo ainda para enviar uma mensagem para Portugal a avisar do paradeiro e do fim iminente da aventura e, por fim, embarco para casa.

København, Danmark -> Helsinki-Vantaa Airport, Suomi (avião: voo SK 1712 da Scandinavian Airlines)

Sento-me num avião praticamente vazio e adormeço assim que ponho o cinto de segurança. Não sinto o avião levantar nem aterrar, foi uma hora e meia que em que a minha consciência esteve algures que não no meu corpo. Acordo com uma hospedeira a dizer-me que já chegámos a Helsinki.

Porco, sujo e possivelmente a cheirar mal – não trocava de roupa há um dia – desembarco na minha cidade, na minha realidade. Reconheço as tabuletas que me indicam para a saída e a confusão que me tinham causado naquela tarde longínqua de Agosto e da simplicidade com que tinha chegado aqui, agora em versão “sozinho e sem boleia”. Mas mais uma vez a moleskine vem em meu auxílio e diz-me que há um autocarro prestes a sair para o centro de Helsinki. Agradeço ao eu passado a previdência (“homem prevenido vale por 1500”) e entrando no autocarro, volto à realidade.

Norah Jones – The Long Day Is Over

Vantaa -> Helsinki (autocarro)

Saio em Rautatientori e apanho o metro para a Hanken, onde tinha uma discussão para IB. Entro pelas portas e imediatamente começo a reconhecer pessoas, horas passadas, coisas feitas e vistas. Sou cumprimentado e cumprimento, sou “elogiado” pelo meu aspecto terrível e dão-me as boas-vindas à vida de Erasmus. Vou buscar o meu almoço – já com saudades da comida da cantina e de uma boa refeição – e enquanto como reencontro mais amigos e sou o centro das atenções. Assim que encontro os meus colegas de IB, percebo que afinal a discussão não era nesse dia. Rio-me para não chorar e acabo pacatamente de comer. Sem mais a fazer na faculdade, ponho-me a caminho de casa.

No metro ligo o telemóvel finlandês e este recusa-se a ligar, talvez por ter ficado sem bateria algures, talvez por princípio, talvez para gozar comigo. Chego a Rastila e alguns metros a andar depois, a Harustie; chego finalmente a casa. A energia que resta não resta sequer para tomar um duche: serve apenas para pôr o telefone a carregar e mandar uma mensagem para os pais a dizer que sobrevivi a tudo e já aterrei no ninho. Tiro os sapatos e o blusão e deito-me na minha cama, para o fim de uma aventura que me levou por 4 países, 4 cidades, 3 aeroportos em 3 capitais, vários meios de transporte e onde dormi num beliche numa cabina de um barco, numa cama de hotel, num colchão num quarto de Erasmus, num beliche numa camarata de um hostel e em bancos de aeroporto. Não duro muito mais que uns minutos acordado e a última coisa que me passa pela cabeça é a fome que vou ter quando acordar e a roupa que tenho para lavar.



2 comments:

Anonymous said...

Que bom que tinha um post ainda não lido aqui à minha espera!!

Mas ainda há mais para contar, ou já acabou? Vá, vamos lá a não perder o ânimo e contar tudo...

Tânia said...

E actualizar o blog para continuar a fazer as delicias das pessoas que tal como eu gostam muito do que escreves, dred? :P Aposto que coisas para contar não faltam ;)beijinho*